Páginas

terça-feira, junho 23, 2009

DEFESA PRELIMINAR

Exmo. Sr. Juiz de Direito da --- Vara Criminal da Comarca de Piracicaba – SP
Proc. N°
Acusando: ALFREDO
DEFESA PRELIMINAR










ALFREDO, já qualificado nos autos epigrafados, pela defensora dativa subscritora, vem, com o devido acato perante V. Exa., apresentar defesa preliminar à denúncia de fls., pelos motivos fáticos e jurídicos a seguir elencados.
PRELIMINARMENTE
Excludente de antijuridicidade
: trata-se de padrasto que castigou a enteada com finalidade educacional.
Consoante ao artigo 23, III, do CP, parte final, “não há crime quando o agente pratica o fato: III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Isso abrange qualquer espécie de direito subjetivo penal ou extrapenal.
Ante o fato de que, como companheiro da mãe, padrasto da criança, o acusando tem obrigação de corrigir a menor e o tapa que deu nela não causou lesão ofensiva; como se verá no decorrer da instrução, não há falar-se em crime, como se demonstrará.
DOS FATOS
Narram os autos que o acusado surrou a menor GABRIELA, 10 anos, filha de sua então amásia, APARECIDA, com fortes tapas nas pernas, causando lesão, conforme laudo de fls., em 18/08/06, fato desmentido pela testemunha, mãe da criança, depoimento da própria criança e laudo pericial.
Note-se que em depoimento que a própria criança prestou, ela costuma “aprontar” de vez em quando, fls., 09, bem como se lê no depoimento da mãe da criança, fls. 10, que não é verdade que o denunciado tenha o costume de bater na filha dela e que, na data do fato, foi a primeira vez em que deu um tapa na menor, o fazendo para corrigi-la porque tinha respondido à ela, portanto, desrespeitado a mãe. Tudo confirmado pelo acusado, no depoimento de fls. 11, que acrescentou, ainda, que moram perto da família da amásia e que todos sabem que ele trata bem a menor.
Nesse sentido, bom é esclarecer que, o acusando tampouco abusou dos meios de correção e disciplina, uma vez que deu apenas um tapa, sem dolo, a título de correção.
Consta, ainda, que o acusando ajuda a companheira na educação e mantença da menor e que, obviamente, tudo não passou de suposições do verdadeiro pai (que, na época dos fatos, convivia com a filha somente há cerca de 5 meses, pois sequer sabia de sua existência) que, por sua vez, extrapolou ao ver a criança com a perna marcada e esta, por sua vez, certamente por desejar morar com o pai, exagerou ao relatar o fato ocorrido, já que tinha carinho pelo padrasto, tanto que o chama de “pai”.
DAS PROVAS
Quanto ao crime do art. 136, a defesa insiste na alegação de que o acusado não causou nenhum dano físico à criança, nem agiu com dolo e ainda, busca o reconhecimento da culpabilidade diminuída, porque não restou provada tal alegação, que baseada apenas no depoimento da criança. Nada nesse sentido ficou caracterizado, não bastando a afirmação da vítima, que, obviamente, não reflete a verdade.
As provas, portanto, são frágeis e insuficientes para embasar o decreto condenatório, sendo certo que o laudo constatou materialidade irrisória, ou seja, lesão leve, melhor explicando: uma mancha roxa na coxa da criança, fls.
A prova testemunhal da mãe, já no depoimento à polícia, deixa claro que o companheiro, ora acusado, jamais agrediu à criança e não é bastante para inexistência do crime de maus-tratos, ainda mais que a palmada dada na menor teve o condão de corrigi-la, pois como a própria criança confessou em seu depoimento, ela costuma “aprontar” e não podem os pais deixar de corrigir para bem encaminhar uma criança, ainda mais quando ela se mostra rebelde e sem respeito pela própria mãe. No caso, o padrasto se equipara ao pai, se vive com a mãe, tem intenção de educá-la e ainda a mantém, no lugar do pai, que se furta à obrigação.
A narrativa da própria mãe evidencia claramente que nunca a criança esteve em situação de perigo e que tudo foi apenas de uma pequena correção, na verdade, obrigação dos pais. Portanto, quanto ao pleito absolutório relativo aos maus-tratos diante dos fatos, razão assiste à defesa, para requerer seja a ação julgada improcedente.
Com efeito, em depoimentos seguros, coerentes e harmônicos, a própria vítima narrou que costuma ter conduta que necessita de correção, e, obviamente, como companheiro de sua mãe, inclusive quem ajuda na mantença da criança, o acusando tinha direito e obrigação de educar, o que, obviamente, significa corrigir com pequenos tapas, ante à teimosia infantil, porque nenhum adulto suporta infinitamente nem a falta de educação nem os caprichos de uma criança; nem por isso deve ser condenado, sob pena de estar contribuindo para criar uma criança rebelde, que poderá se transformar em adulto sem noções, que por “falta de educação” (correção).
O laudo pericial, que encontrou apenas pequena mancha roxa, prova que a criança não foi surrada, sendo que caracterizou a lesão de leve.
DA DOUTRINA
Face ao exposto, há excludente de antijuridicidade porque, segundo Welzel (Apud PRADO, Luiz Regis - Curso de direito penal brasileiro : parte geral, 2.ed., São Paulo : Revista dos Tribunais, 2001., p. 240), antijuridicidade é “a violação da ordem jurídica em seu conjunto, mediante a realização do tipo”. Nesse contexto, Prado conclui, então, do estudo das obras de Welzel, Maurach e Cerezo Mir, que “A realização de toda ação prevista em um tipo de injusto de ação doloso ou culposo será antijurídica, enquanto não concorrer uma causa de justificação”. (p. 240-1). No caso, a causa de justificação, a excludente de antijuridicidade, é o fato de o acusando, como padrasto, a quem a criança chama de “pai”, tinha o direito e a obrigação de ajudar na educação da criança, que necessitava de correção, já que vinha desrespeitando a mãe, o que nos leva a inferir que a ação, mesmo típica, possui uma causa de justificação, devendo o seu caráter de ilicitude ser excluído da análise. Assim, embora a tipicidade, não há ilicitude por ter a ação causa justificante. Essa a excludente de antijuridicidade já delineada pelo ordenamento jurídico vigente, que recai sobre toda conduta correspondente, não sobre um agente em particular. (Prado, p. 241)
E, se considerarmos mestre Damásio, para quem a “antijuridicidade é sempre material, constituindo a lesão de um interesse penalmente protegido”, também assiste razão ao acusando que simplesmente deu uma palmada na perna da criança, não lhe causando nenhum perigo, apenas pequena mancha roxa. De onde resta que sendo a antijuridicidade requisito de um crime, se pode ser afastada por algumas causas, como já dito anteriormente, em face da justificação, há excludente de antijuridicidade que, se não afasta o caráter típico da conduta, não autoriza a condenação porque não há crime: “excluindo-se a ilicitude, e sendo ela requisito do crime, fica excluído o próprio delito. Em conseqüência, o sujeito deve ser absolvido”. (JESUS, Damásio E. - Direito Penal: parte geral. 27ª .ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v.1., p. 360)
Por tal motivo, nosso Código Penal expõe, no artigo 23, as causas de exclusão:
“ Não há crime quando o agente pratica o fato:
I – em estado de necessidade;
II – em legítima defesa;
III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito”.
Daí resta ponderar que a ação se revestiu de requisitos objetivos e também subjetivos, que demonstram o ânimo do agente devidamente enquadrado nos casos de exclusão de antijuridicidade expostos no Código Penal vigente, pois presentes os requisitos elementares do tipo que excluem a antijuridicidade, tornando a conduta antijurídica, de modo que não houve excesso na correção aplicada à criança, conforme laudo. Tampouco houve intenção de causar dolo ou colocar a criança em risco. Quando muito, houve excesso derivado de erro, em que o autor, em face de se considerar “pai” da menor, não podendo responder por excesso culposo ou por responsabilidade a título de dolo com pena diminuída (quando erro, por ter exercício regularmente o direito de promover educação, já que, inclusive, participava da mantença da criança. Assim, o acusando jamais pensou estar exercitando um direito/obrigação que não tinha, obviamente, não agiu contrariamente a ordem jurídica e sim, de acordo com ela.
DA JURISPRUDÊNCIA
Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL - TORTURA E MAUS TRATOS - DOLO - Distinção a ser efetuada em face do elemento subjetivo - Castigo fisioo aplicado em infante com intuito de aprendizado e não por puro sadismo imotivado - Inexistência do dolo da tortura - Apelos improvidos. Apelação Criminal 3722683200. Relator(a): Haroldo Pinto da Luz Sobrinho. 6ª Câmara de Direito Criminal. Data de registro: 15/07/2003.

DO PEDIDO

Ante o exposto, a defesa requer seja a denúncia julgada improcedente porque baseada exclusivamente na versão isolada da ofendida e passível de engano e o réu absolvido por excludente de antijuridicidade ou absoluta falta de provas ou ainda, desclassificando-se o delito de maus tratos para lesão corporal (leve), bem como se modificando o regime prisional para o crime de detenção.

Considerando ainda alguma pena que porventura puder vir a ser aplicada, caso V. Exa. entenda diversamente, requer a prescrição da pretensão punitiva intercorrente e extinção da punibilidade do recorrente de oficio, prejudicado o exame do mérito.

Protesta e requer provar o alegado por todos os meios em direito admitidos, resguardando-se o direito de apresentar o rol de testemunhas em momento oportuno.

Pede deferimento.

Piracicaba, 20 de março de 2009.


Rita Rafael
OAB/SP:
Powered By Blogger